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Opinião – Município pode cobrar ITBI na formação das Holdings Rurais? – Por Leonardo Amaral e Sérgio de Araújo

ENTENDENDO O CONTEXTO

Um dos pontos principais na formação das holdings rurais é a transferência do imóvel rural pertencente ao produtor rural (patriarca/matriarca da família) para a pessoa jurídica constituída.

Nessa transferência do imóvel rural para a formação do patrimônio da pessoa jurídica (capital social) não deve incidir o ITBI, que é um imposto municipal, em razão de uma regra de imunidade constitucional.

O que iremos avaliar nesse artigo é se a transferência do imóvel rural do produtor para a constituição de uma holding rural  foi afetada pela decisão do STF, em que se reconheceu a legitimidade dos Municípios para cobrarem ITBI sobre a diferença entre o valor do imóvel a ser transferido e o capital social integralizado.

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COMO OCORRE A TRANSFERÊNCIA DO IMÓVEL RURAL PARA A HOLDING?

Na transferência do imóvel rural para a formação da holding a regra sempre foi a de que não deveria incidir o ITBI, que é um imposto municipal, pois há uma regra na Constituição Federal que proíbe.

Frente a não exigência do ITBI na forma acima, a preocupação do produtor rural nessa operação de transferência do seu imóvel para a holding sempre foi a de evitar a obrigação de pagar o imposto de renda pelo ganho de capital, que é a diferença do preço de aquisição com o preço da alienação.

Assim, para evitar a cobrança do imposto pelo ganho de capital, na forma acima mencionada, o produtor se vale de uma autorização legal e transfere o seu imóvel rural para a holding pelo valor registrado na sua declaração de imposto de renda[1].

Ainda, o valor do capital social da holding é fixado no mesmo valor do imóvel que fora transferido pelo produtor rural na integralização.

Veja que, nesse mecanismo, o valor do imóvel rural é o mesmo do capital social, mas é importante registrar que não é raro encontrarmos contratos sociais com valores diferentes, em outras palavras, o capital social estar fixado em valor menor do que o do imóvel.

Para registrar a operação em cartório, o produtor tem que apresentar uma certidão, emitida pelo Município onde se encontra o imóvel, em que se afirma a não incidência do ITBI.

O problema surge aqui!

O PROBLEMA

Inúmeros Municípios, ao avaliar o pedido de não recolhimento do ITBI apresentado pelo produtor rural, em alguns casos, têm decidido pela cobrança do imposto.

Em regra, a cobrança do ITBI  na formalização da holding ocorre em duas situações: a) quando o capital social é fixado em valor menor do que o do imóvel rural transferido; b) quando o valor do capital social seja o mesmo do valor do imóvel informado na declaração do imposto de renda, mas este último seja inferior ao valor de mercado.

Assim, se, por exemplo, o valor declarado dos bens for de um milhão de reais e o valor do capital social a ser integralizado for de duzentos mil, alguns municípios entendem que podem exigir o ITBI, sobre a diferença, isto é, oitocentos mil reais.

Na segunda hipótese, se, por exemplo, o valor do imóvel rural é de um milhão reais e coincide com o valor do capital social, mas é diferente do valor de mercado, que é de três milhões. Nessa situação, alguns municípios acreditam que podem cobrar o ITBI, sobre a diferença de dois milhões.

O QUE PODEMOS ESPERAR APÓS A DECISÃO DO STF?

O caso concreto decidido pelo STF tinha por tema a exigência do ITBI sobre a diferença existente entre o valor do imóvel informado na declaração de renda e o capital social formado, não existindo qualquer debate sobre valor de mercado.

O STF fixou a tese de que é legítimo ao Município exigir o ITBI nas transferências de imóveis para formação do capital social de uma pessoa jurídica, quando existir a diferença entre o valor do imóvel e o capital social formado.

Veja que a decisão acima não menciona se o valor do imóvel é o valor de mercado ou se é aquele informado na declaração de renda, o que dá margem para que os Municípios queiram exigir o ITBI também sobre eventual diferença entre o valor de mercado do bem imóvel e o valor do capital social, o que não foi objeto de discussão pelo STF.

Portanto, após a decisão  do STF sobre o ITBI, podemos esperar muita confusão e insegurança jurídica na formação de uma holding rural, pois, em sua constituição, é bastante comum que o valor de mercado do imóvel, apurado pelo Município, seja sempre superior ao valor a ser integralizado, situação provocada pelo uso da técnica que evita o surgimento do ganho de capital.

Em conclusão, entendemos que a cobrança do ITBI na forma acima é invalida, em razão da decisão do STF tratar de outra situação, mas, no cenário atual, é extremamente provável que inúmeros municípios se aproveitem da confusa decisão e se sintam encorajados a usá-la para justificar a cobrança do ITBI na formação das holdings rurais, gerando uma grande “dor de cabeça” para o produtor e provocando o ajuizamento de várias ações judiciais.

Alguém duvida?

De fato, o Brasil não é para amadores!

[1] Quanto a legislação sobre o Imposto de Renda, tem-se a regra desde 1996, as pessoas físicas podem transferir a pessoas jurídicas, a título de integralização de capital social, imóveis rurais pelo valor constante da sua Declaração de Bens ou pelo valor de mercado, observado o que diz o art. 23 da Lei nº 9.249/1995.

Artigo escrito por Leonardo Amaral, advogado, especialista e Mestrando em D. Tributário pelo IBET, Professor IBET-GO; e Sérgio de Araújo Lopes, advogado, Mestre em D. Tributário pela PUC-SP, Professor IBET-GO.

*As opiniões expressas pelos colunistas não refletem a opinião da AGRNotícias, sendo o autor do texto, responsável pelo conteúdo.

 

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